3 de abril de 2008

Repetição

Há sempre algo de ausente que me atormenta.

Camille Claudel




I whip myself with scorn. E nunca precisei esconder. Não é tão fácil e simples apertar o botãozinho que nos liberta de nossos sonhos. Os meus ainda me aprisionam e é absolutamente impossível desvencilhar-me deles, como se eles tivessem um dia se configurados reais ou atingíveis. Repito as palavras de uma amiga: quando quero, não tenho. O espelho reflete mãos de ausências, coração pesado, olhos fatigados de procurar por algo que eu nem sei. E isso que eu nem sei me atormenta e me tira qualquer resquício de paz que eu ainda tenho. Nos dias em branco, descubro [espantada] que o vazio pesa muito mais que todos os sentimentos do mundo. E descubro também que é desnecessário carregá-los. Não sei até quando eu vou me boicotar, tentar assassinar o coração, sufocar as entrelinhas com palavras absurdas que só as desviam de seu caminho. Até quando fugirei de mim? Mas é como tenho dito: só me resta esperar que isso passe. Porque nem todo perfume dura para sempre nas mãos.






Porque tinha suas ausências.
O rosto se perdia numa tristeza impessoal e sem rugas.

Uma tristeza mais antiga que o seu espírito.
Os olhos paravam vazios; diria mesmo um pouco ásperos.
A pessoa que estivesse ao seu lado sofria e nada podia fazer. Só esperar.

Pois ela estava entregue a alguma coisa misteriosa, infante.
Ninguém ousaria tocá-la nesse momento.
Esperava-se um pouco grave, de coração apertado, velando-a.
Nada se poderia fazer por ela senão desejar que o
perigo parasse.
Até que num movimento sem pressa, quase um suspiro,
ela acordava como um cabrito recém-nascido
se ergue sobre as pernas. Voltara de seu repouso na tristeza.


Clarice Lispector

Um comentário:

Liana disse...

o espelho nem sempre vai refletir ausências, solzinho. no entanto, enquanto o fizer, só nos resta dar tempo ao tempo.


"calma, alma minha, calminha!
ainda não é hora de partir.."