9 de setembro de 2014

V

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Fonte: Marta Laura

Depois, quero esquecer.
Tens razão, Halla.
Estará morto depois do esquecimento.
E eu arrancarei o coração com as mãos se ele falhar e lembrar.
Arrancarei o coração e, depois de seco, servirá de trapo para limpar apenas coisas estúpidas.
Coisas vugares.
Não servirá para mais nada.

[Valter Hugo Mãe, em A desumanização]



Difícil controlar o pensamento. Quando dou-me conta, encontro-me na pista de dança, encontro-me na tua cama, encontro-me no teu abraço. Encontro-me em ti. Escrevo estas folhas a custa de que algo alivie aqui dentro. De que consiga respirar melhor. Tu estás em todos os lugares e em todas as melodias que escuto. Imagino o teu perdão. Imagino o perdão pelas minhas mãos. Tua boca a procurar a minha, silenciosamente, como nos dias de calor. Não há mais tempo para desassossegos. Não há mais tempo para nós. A tua lembrança me atormenta. Aos poucos, tu morres em mim. Quando me deito, tu morres um pouco. Quando acordo, já tens morrido o suficiente. Morres em mim a cada minuto. No entanto, nunca estiveste tão vivo. Queria te matar. Arrancar do peito a tua lembrança. Tua voz. Teus gostos. Queria arrancar do peito o mal que me fizeste. E perdoar-te. Embora meu perdão nada seja no teu deserto. Embora nunca precises. Eu, que nada fui para ti. Deixaste-me sangrando no mesmo lugar onde salvaste-me a vida. Fecho os olhos e custo a acreditar nas imagens que se formam. Como foste capaz de me magoar assim? Não consigo te perdoar. Agora, quero esquecer-te. Fechar os olhos e ver o mundo. Mas não o teu riso. Tudo menos o teu riso.

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