Nas
noites que antecediam aquelas quintas-feiras, eu já não dormia, comia, ou lia.
Meus gestos ou qualquer tentativa de sair daquela imobilidade resultavam: nulos.
As horas que antecediam aquelas quintas-feiras: a escolha dos lençóis, as
toalhas lavadas, os livros deliberadamente espalhados pela mesa, pedaços meus
pela casa, junto com o cheiro do sabonete e hidratante e perfume que ecoavam
pelo corredor.
Não
recordo qual a razão, se a contagem dos minutos até que o celular sinalizasse e
surgisse na tela - Aqui - impossibilitava a realização dessas tarefas, se a
fome do corpo tornava-se tão voraz a ponto de paralisar, se as lembranças de
outras quintas-feiras evocavam a memória corporal e fechar os olhos e recordar
era a resposta oferecida pelo meu corpo para conter tamanha aflição; mas em
algum momento, no decurso desses meses, a única alternativa viável para o
coração e para o corpo tornou-se: esperar.
Essa
tarefa que me impus - esperá-lo - não era fácil. Imóvel, deitada na cama, sem
roupa, cabelos molhados, meu cheiro ecoando na casa pelo corredor com o vento
da janela, o celular na mão a espera daquela palavra que era luz, que me
salvaria de mais uma noite jogada nesse mundo sem ninguém, sem esperanças,
vazia, cansada, coração seco como um trapo, apertado, disparado, coração a
esperar.
[II]
Tudo
começou numa quinta-feira. Os meses, eu cansei de contá-los. Antes de desabarem
sobre mim aqueles sábados e domingos e segundas - até chegar o dia em que meus
lábios encontrariam o céu, meu corpo, a vida - eu era agonia. Carne viva,
tormento no coração.
Seu
cheiro, sua maneira de entrar e segurar o meu braço enquanto a porta era
fechada. O modo como segurava o meu cabelo e o retirava do meu rosto, o meu
rosto envergonhado, meus olhos que encaravam o chão, nunca seus olhos. Sua
forma de me conduzir pelo corredor até a cama, mãos perscrutando meu corpo numa
abordagem silenciosa, fatal, arrebatadora, até tirar qualquer pensamento,
qualquer vestígio de palavra, de linguagem, de fôlego, restando apenas
suspiros, sussurros compreendidos pelos nossos corpos juntos, sua língua no meu
ouvido, suas pernas a me segurar, sua mãos no controle.
-
Aqui. E toda a devastação concedida por uma única palavra: - Aqui. O barulho do
seu carro parando, - Aqui. Uma porta a separar nossos corpos, - Aqui. O som do
celular e o sorriso a me escapar,- Aqui. E então o céu vinha até mim.
[III]
Esqueci,
com o passar dos meses, como ficar em paz. Seu cheiro, sua forma de sair do
carro, abrir o portão, suas mãos em mim ainda no corredor a descer e subir,
percorrendo lugares que eu até então não conhecia. Sua voz: - Te quero. Sua
boca - como água pura - era remédio, recompensa, salvação daqueles dias de cão,
os dias que passava a esperá-lo. Sempre e cada vez com mais agonia. As palavras
sufocadas pela voz do corpo. O corpo tomado pelo desejo. O desejo sufocado pela
espera. Como o mundo pareceria possível?
O
tempo que passei a esperá-lo. Os dias que passei a esperá-lo. Os meses que
passei a esperá-lo. Inútil, algumas vezes. Eu, deitada, meu cheiro ecoando pela
janela, celular em mãos: - Não. Inútil. Meu cheiro pelo corredor, nos lençóis:
- Não. A toalha limpa encostada à cabeceira da cama: - Não. Eu, aos solavancos
- numa mistura de líquidos, lágrimas, sintéticos, unhas roídas, cabelos caídos
- tentando me erguer. Tudo resultou em erro. Tudo era erro, desde o princípio.
2 comentários:
Il a mis le café
Dans la tasse
Il a mis le lait
Dans la tasse de café
Il a mis le sucre
Dans le café au lait
Avec le petit cuiller
Il a tourné
Il a bu le café au lait
Et il a resposé la tasse
Sans me parler
Il a alumé
Une cigarrette
Il a fait des ronds
Avec la fumée
Il a mis des cendres
Dans le cendrier
Sans me parler
Sans me regarder
Il s’est levé
Il a mis
Son chapeau sur la tête
Il a mis
Son manteau de pluie
Parce qu’il pleuvait
Il est parti
Sous la pluie
Sans une parole
Sans me regarder
E moi j’ai pris
Ma tête dans ma main
E j’ai pleuré.
UAU.
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