22 de julho de 2010

Ao passado


- Perdoaste?- perguntou por fim Mítia.

- Eu te amo porque teu coração é generoso!- disse Cátia - Não tens necessidade de meu perdão, nem eu tampouco do teu. Que me perdoes ou não, a lembrança de cada um de nós ficará como uma ferida na alma do outro, isto deve ser...- Deteve-se para tomar alento.- Por que vim? Prosseguiu ela, febrilmente. Para beijar teus pés, apertar tuas mãos até doerem, lembras-te? Como em Moscou, para dizer-te ainda que és meu deus, minha alegria, para dizer que ter amo loucamente - gemeu ela, num soluço.

- O amor desapareceu, Mítia - continuou ela-, mas o passado é-me dolorosamente querido. Fica-o sabendo para sempre. Agora, por um instante, o que teria podido ser- murmurou ela, com um sorriso crispado, fixando-o de novo com alegria. – Agora, amamos cada um para nosso lado, no entanto, amar-te-ei sempre, e tu também sabia-lo? Ouve, ama-me, ama-me toda a tua vida!- suspirou ela, com uma voz trêmula em que havia leve tom de ameaça.

- Sim, eu te amarei e...Sabes, Cátia - disse Mítia, parando a cada palavra - toda a minha vida! Será assim, para todo o sempre.

Assim trocaram eles essas frases quase absurdas e exaltadas, mentirosas, talvez, mas eram sinceros e tinham em si uma confiança absoluta.


Dostoievski, in Os Irmãos Karamazov

Um comentário:

Anônimo disse...

LINDÍSSIMO!!!!
Qual o livro?
Amei, principalmente "o passado é-me dolorosamente querido"
Bjos,
Ly