2 de março de 2015

Desde sempre

      Foto: Tina Sosna


Seduzem-me os movimentos deste momento
em que fecho os olhos para que os frescores da tua lembrança
me visitem com as lânguidas línguas do sentimento
Estremeço como se ainda colhesses serenamente uvas úmidas
no veludo inverso do meu sexo
com movimentos de peculiar doçura
O perfume quase marinho do ar dilata as minhas narinas
e posso sentir o calor do teu hálito subindo pelas minhas pernas
derramando pelo caminho palavras de náufrago
benditas palavras de nuvem
Como na primeira vez que tuas mãos buscaram meus contornos
- ainda exalavam um insone perfume de desertos -
estou envolta em cálida penumbra
e revejo teus olhos se acenderem nos meus seios
Aperto tua coxa entra a minha coxas
antes que me deites e abras devagar as minhas pernas
soprando um dialeto rouco em meus ouvidos
por onde me entorpeces e desvendas
Açoitam-me os dias arrastados em que essas imagens
só acenam de longe, como se te perdesse
na paisagem fosca do cotidiano
Poderia sangrar o coração até sangrar aquela noite
em minhas mãos
Onde repousavas, espírito e matéria que busco
no árduo exercício da existência?
Mais que amorosa mágica: rio em que levitassem pedras.

Ledusha Spinardi, in Exercícios de Levitação.


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