26 de setembro de 2014

VI

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Fonte: Tina Sosna

Entro no quarto, procuro refúgio no passado. Mas não posso me esconder inteiramente nele. Não sou o que era naquele tempo. Falta-me tranquilidade, falta-me inocência, estou feito um molambo que a cidade puiu demais e sujou.

[Graciliano Ramos, em Angústia, p. 24]

Parece-me que estou a perder tudo. Continuamente, tudo escapa-me. Nada fica no meu coração. Tenho visões. Pensamentos confusos. Lembranças embaçadas. Cada dia tenho mais medo. Cada dia endureço mais. Perdi o sono novamente. Difícil dormir. Ando intranquila. Atormentada com a memória infalível do teu riso. Da tua graça. De ti. Por que não me permites sossegar o coração? Coisas que antigamente me agradavam tornaram-se insustentáveis de se realizar: ler um livro, ver um filme, estar com amigos. Tudo é difícil, pesado, insuportável. Perdi muito com o pensamento em ti. E algumas perdas, percebo com dor, são irreparáveis. Sento-me no bosque. Gosto de ver desconhecidos. Tento adivinhar-lhes os gostos, os sorrisos. Trazem algo no coração? Estão tão assustados quanto eu? Conseguem dormir ao encostar a cabeça no travesseiro? Penso: nada mais me afeta. No entanto, enchem-se de lágrimas meus olhos apenas com o balançar das árvores pelo vento. Fecho meus olhos. Sinto o vento dentro de mim. Peço tranquilidade para os meus dias. Esperança para os meus sonhos. Coragem para continuar. Os anos pesam sobre meu corpo. Minha face expõe os primeiros estragos do tempo. Pessoas ao meu lado conversam e a vida parece-me tão simples, agora. Não mais escuridão profunda. Gosto de olhar as pessoas. 

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