18 de janeiro de 2008

Pontuações acerca de Dimítri




É natural a inclinação que temos em nos identificarmos com alguns personagens romanescos. Quanto a mim, pelo menos, nunca foi diferente – acontece com bastante freqüência. O que sempre me fascinou em Dostoievski é a tessitura de suas narrativas, elaboradas com o caráter de nos deixar profundamente ansiosos, sempre à espera de um porvir (que às vezes, nunca vem) e geralmente muito densas. Apesar de doente e bombardeado por inúmeros infortúnios, ele escreveu. E foi com grande agitação que escreveu Os Irmãos Karamázovi. O que eu, leiga, poderia dizer dessa obra que não esplendorosa e magnífica. Certamente, uma de suas obras-primas. Vejo Os Irmãos Karamázovi como, antes de um romance, sutilmente uma obra filosófica. E Sartre quem o diga! O Existencialismo com uma corrente estritamente filosófica, com alta probabilidade, bebeu em fontes como Memórias do Subterrâneo e Os irmãos Karamázovi.


Dimítri Fiódorovitch Karamazov era o filho mais velho de Fiodor Pávlovitch. Os Karamázovi eram caracterizados como pessoas sem nenhum senso moral, com uma sede de viver inextinguível.




Concluo de tudo que era um rapaz estourado, arrebatado de paixões vivas, um boêmio ao qual bastava dar um osso para acalmá-lo até nova ordem. Caracterizava-o como um ser sem dúvida violento e arrebatado pelas suas paixões, mas nobre, altivo, generoso, capaz de se sacrificar se lho pedissem.
O autor prefere Aliocha – filho mais novo – como o “herói” de sua obra, mas aos meus olhos, Mítia (Dimítri) é o que me fez acelerar o coração, roer as unhas, maldizer seu destino. Ivã (segundo filho), mesmo com suas idéias originais e seu caráter admirável, proporcionou-me apenas curiosidade. Mas com Mítia foi identificação na certa. Não só porque era arrebatado pelas suas paixões (Grúchenhka ou Catarina, pouco importa), mas porque quase tudo para ele se resumia nisso: arrebatamento. E suas paixões, apesar de quase se limitarem a essas duas mulheres, teriam sido desenvolvidas na continuação prevista para esse livro (que infelizmente não foi escrito).
- Não, a vida está cheia, a vida extravasa mesmo sob a terra! Não podes crer Aliocha, como quero viver agora, a que ponto a sede de viver se apoderou de mim, precisamente nessas paredes degradadas! Que é o sofrimento? Não o temo, fosse ele infinito. Outrora o temia... Com a força que sinto em mim creio-me em condições de dominar todos os sofrimentos, contanto que posso dizer a mim mesmo a cada instante: existo! Em meio dos tormentos, crispado pela tortura, existo! Amarrado ao pelorourinho, existo ainda. Vejo o sol e, se não o vejo, sei que ele luz. E saber isso é já toda a vida.Sim, Mítia é o meu preferido. Evidentemente, o livro não se resume a ele. É uma longa narrativa em que os personagens se chocam e se desenvolvem a partir desses choques. O que seria Mítia se não apenas uma estranha e imperfeita colisão?




- Perdoaste?- perguntou por fim Mítia.
- Eu te amo porque teu coração é generoso!- disse Cátia - Não tens necessidade de meu perdão, nem eu tampouco do teu. Que me perdoes ou não, a lembrança de cada um de nós ficará como uma ferida na alma do outro, isto deve ser...- Deteve-se para tomar alento.- Por que vim? Prosseguiu ela, febrilmente. Para beijar teus pés, apertar tuas mãos até doerem, lembras-te? Como em Moscou, para dizer-te ainda que és meu deus, minha alegria, para dizer que ter amo loucamente - gemeu ela, num soluço.
- O amor desapareceu, Mítia - continuou ela-, mas o passado é-me dolorosamente querido. Fica-o sabendo para sempre. Agora, por um instante, o que teria podido ser- murmurou ela, com um sorriso crispado, fixando-o de novo com alegria. – Agora, amamos cada um para nosso lado, no entanto, amar-te-ei sempre, e tu também sabia-lo? Ouve, ama-me, ama-me toda a tua vida!- suspirou ela, com uma voz trêmula em que havia leve tom de ameaça.
- Sim, eu te amarei e...Sabes, Cátia - disse Mítia, parando a cada palavra - toda a minha vida! Será assim, para todo o sempre.
Assim trocaram eles essas frases
quase absurdas e exaltadas, mentirosas, talvez, mas eram sinceros e tinham em si uma confiança absoluta.
[fotos: Vincent Teulière]

3 comentários:

Anônimo disse...

Mítia é apaixonante do começo ao fim, é o meu preferido apesar de me identificar mais com Ivan e mais ainda com o menino Kólia (que aparece no meio da narrativa). Aliocha acho bundão demais. rsrs Acho Katia um pouco fingida, não acredito muito nas coisas que ela fala, é que nem Aglaia em os
Demônios. Esses foram os personagens que mais me marcaram, quero ler esse livro de novo. Já faz 3 anos que li. Foi o meu primeiro Dostoievski. Gosto de todos os Dostoievski, mas os irmãos karamavoz é onde ele constroi os melhores personagens da forma mais profunda possível.

Unknown disse...

esse livro parece ser bom...
diferente dakela outra citação feita num post anterior!
acredito em amores verdadeiros, amores q se julgam eternos, infinitos...
Mas quem sou eu pra dizer q o amor entre os dois não era verdadeiro?
não. eu nunca li o livro pra saber como acaba a historia...

Mas digo e repito, historias de amor sem final feliz, não são boas historias!

Anônimo disse...

minha querida, você nem imagina como tudo isso que você escreve me emociona profundamente...

acho linda a propriedade com que você fala de Dosdo(como você mesma o chamava, eu me lembro bem..)
você não é mesmo leiga,viu...você é PHD nesses escritores russos, e eu adomiro muito isso,
eu vejo a nitídamente na sua escritura toda a sua angústia, ansiedade...mas também, vejo o quanto você tenta entender seus próprio sentimentos, tenta colocá-los pra fora...como mario quintana dizia: "AMAR A DOR, COMO UMA MANEIRA DE SUPORTÁ-LA!
suas palavras despertam os melhores sentimentos em mim...!

beijo grande